sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Crônicas no olhar - Gente

Gente



Saindo de casa, logo na esquina, dois caras olham, buscando uma aprovação no olhar meu. Um deles se aproxima e limpa o vidro do meu carro e digo que não quero e mesmo assim limpa, conversando num portunhol. Descubro que são colombianos e estão por ali (na periferia) até acabar a copa América de futebol. E que acharam um jeito de arrumar uma grana. Simpáticos, terminaram. Os dois sorriram agradecidos e pegaram a "grana".

Nossa cidade é um oásis de almas diamantes.

Uma senhora curvada com uma sacola de mercado, dessas que custam dinheiro e são péssimas, caminha a passos curtos, curtíssimos. Talvez na sua casa só tenha ela, uma panela no fogão, um gato, roupas sobre a cama, um banheiro limpinho e cheiroso e uma história. Ou várias. No retrovisor, sua imagem foi diminuindo, "diminuin", "dimin", "indo".
Entre batons da Mary Kay, a suscetível mocinha em lábios carnudos, reboca sua face com esponjinha de base num farol fechado, vidros abertos, vizinhos em volante e displicência vaidosa. Penso na vaidade assolada e em celulares de farol. Vou. O batom demora para entrar na sua casa e buzinas soam.
Ao lado, um ônibus articulado, aparentemente vazio como uma centopeia, faz zigue-zague, dono da rua. Cidade grande. Metrópole!

Meninos jogam bolinhas e pedem dinheiro, balinhas no retrovisor com uma de brinde e sorriso de vendedor é ação, propaganda de prostíbulo e afins aumentam meu guarda lixo.

Um homem, todo de preto (acho que está escuro porque está sujo), chinelos com correias amarelas nos pés limpos, dois carroções repletos de sacos pretos de lixo embocados formando uma única estrutura e no alto uma espécie de estrutura de espelho de camarim (se não for, fiz ser). Um excelente cenário de uma peça teatral. Ele, calmo, sentado em uma cadeira de vime, observa, não me olha, talvez me vê. Levanta-se e abre um saco e de lá tira uma garrafa de plástico dessas de água. Toma. Fecha. Ação! Alguém buzina.

Na calçada uma turminha de rapazes, barbudinhos, cabelo cortado, bíceps torneados tomam cerveja em copos, talvez chopp. Um olhar reprovador de uma meia senhora, não pela cerveja, mas pela vestimenta. Enxergo preconceito. Mas não sei.

Escuro do túnel, no rádio uma música que diz ..."eu prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo."
Canto e viajo dentro de mim. A melhor viagem que conheço.

Um cãozinho e uma senhora com uma sacola dessas de mercado que custam dinheiro e são péssimas - estava cheia!
..........................
.....ambulante....

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