deitarQuando o assunto é teatro, faz-se necessário ter em mente alguns conceitos bem claros, entendidos e extensamente amados dentro de si: comprometimento, disciplina, bom humor, criatividade e um corpo vivo.
Outro dia, iniciando uma aula sobre teatro com alunos adolescentes, uma aula prática de disposição, percepção e vivacidade, um aluno, que já tinha me dito que queria ser ator, deitou-se sobre o tatame e deixou-se vencer pela agonia (dele) de ter que ouvir, processar e agir. Sentou-se e depois deitou! Deitou! Pensa se fiquei furioso? Fiquei, mas com o coração leve. Pensei: “Se o moço (que diz querer ser ator), não consegue ter o comprometimento consigo mesmo numa aula de teatro, imagine como será lá na frente? Ele terá que ampliar (e muito) esse senso de comprometer-se. Hoje é com ele. Amanhã, vai ser com ele, com o estudo, com os amigos atores, com o diretor, com o processo, com o corpo, com o espetáculo, com o público, com o Teatro”. Levante-se! – Pedi. A resposta foi um silêncio desprezível. Definitivamente, para ser ator, o respeito vem antes de tudo. Se você não respeita você ou alguém, como comprometer-se com aquilo que almeja? – respondi e toquei o barco com a turma que, a essa altura, me olhava com grandes olhos e ouvidos largos.
“Disciplina é liberdade”, já cantava Renato Russo em uma das suas muitas canções. Pois é isso mesmo. A disciplina contamina para trazer a liberdade que o ator precisará no decorrer de um processo teatral; Comprometer-se (olha a palavrinha aí novamente) com as regras e ousar acatar a disciplina acertada por horários, caminhos, estudos e compromissos o levará a uma ousada liberdade e trilhará um caminho por onde ele – o ator – versará seus venenos e doces sabores. Ter disciplina não é e nunca será só para soldados da pátria, são para os soldados da arte também.
bom humorTodo processo deve ter bom humor. Isso não significa que tenha que ser bagunça, pois bagunça não é sinal de humor. Quando cito o humor, penso na ideia que a leveza de um entendimento seguido de palavras, sorrisos e coração leve é muito engrandecedor ao processo à medida que picuinha, opressão e grosseria faz do processo, um caminhar de tartaruga. A seriedade do processo não deve ser pautado por largos sorrisos ou cara amarrada. A seriedade deve estar em qualquer projeto! O bom humor também. Eu trabalhei anos com teatro humor, e já ouvi gente falando: “Ah vocês morrem de rir nos ensaios, né?” Sim, mas não morremos, porque o babado é sério!
Criador ou criatura, criatividade ou criação, criar ou não criar. Eis a questão. Não há um bom ator, se ele não instigar esse sobreolhar, se a sua imaginação não for abusada. Tem pessoas que são muito “ratas” na criatividade ou criação, outras não. Requerem um tempo. E está tudo certo. O importante é abusar dessa caixa pensante e não ter medo de errar. No processo pode-se errar abundantemente. Aliás, de grandes erros, podem aparecer grandes acertos. No Teatro é assim, a criatividade não é uma figura para pintar, é uma figura a ser construída para pintar.
corpoAh, o corpo! Um corpo vivo que consiga atingir a plateia pelos poros e pelo olhar e que não seja dissociado do ator, da palavra e da não palavra é a máquina, a engenhoca do processo. Para se achar esse corpo há de entendê-lo: sua formação biológica, a extensão da ação, a história física do ator, a história física da personagem, tempo, os movimentos, os gestos, a respiração, entre outros. O corpo dança sempre conforme a música, mas essa música pode não ser a que toca externamente. O corpo vivo não é só dançar o rebolation, corpo vivo é muito mais!
Esses cinco amores descritos acima pode não ser sinônimo de sucesso, porém, podem fazer a diferença. A sua!
Ah, e o adolescente lá do primeiro parágrafo continuou em silêncio até o final da aula. Acho que pensando: “Careca babaca!”
Ou envergonhado por não ter comprometimento perante a vida e as suas escolhas. Mas calma, garoto, o caminho ainda é longo. Dei-lhe um grande abraço!