satyrosUma imagem teatral me vem à memória quando, aos 15 para 16 anos eu fui, sozinho, pela primeira vez, assistir à Sades ou noites com os professores imorais, da cia teatral Os Satyros, lá no bairro do Bexiga num teatro que não lembro o nome. Ou já seriam 18? Haja vista, que o conteúdo de corpos seminus, nos pegando (plateia) era extremamente sensual e sexual. Não sei, não me lembro, mas a imagem é nítida aqui na minha caixola. Neste dia decidi, para mim, que eu ia ser ator um dia. Nem que fosse para fazer uma única peça de TEATRO na minha única vida, da qual eu não fazia a menor ideia do que seria.
Eu já tinha o teatro como prática. Tinha uma professora maravilhosa de Educação artística no ensino colegial no Colégio Quirino, da Vila Guarani – Nanci Morgatto – que usava o teatro como ferramenta em aula, bem como suas inúmeras e criativas aulas de arte, que incluíam, além do teatro, esculturas em lápis, giz, sabão, desenhos em perspectivas, desenhos geométricos, crochê em pano de prato e uma sabedoria ímpar no quesito arte. Ela é a grande responsável pelo artista que ousei ser. Pequeno artista mas sou.
rockNessa época, nos anos 80 e 90, a minha maior diversão era ficar em casa ouvindo rock’n’ roll na extinta rádio 97 FM, a rádio rock do ABC paulista. Tinha acabado de mudar para um bairro que me afastou dos meus melhores amigos e acabei sendo amigo do meu quarto, do meu rádio, dos meus discos, dos livros ainda não (nessa época eu ainda não os havia descoberto como a magia que são). Ficava escrevendo qual música tocava mais e acabei conhecendo uma pá de rockstars pelo nome. Alguém aí conheceu 51 st States of America, do grupo New Model Army? Pois eu conheci aí, no meu quarto, na minha solidão, perdido em músicas, canetas e questionando a minha sexualidade. Coisa de adolescente….
Me apaixonei nesta fase também, mas não digo por quem…. O que eu mais lia nessa época era jornal, principalmente os cadernos de cultura e entretenimento, o de política, eu só folheava (desconhecendo a importância que a Política exerce sobre os outros setores) e foi num desses cadernos que vi o anúncio da tal peça citada. Fui. Arrumei uma beca invocada, uma camisa, sapatos engraxados com categoria e cai lá no Bexiga, numa peça cheia de gente, com um palco totalmente interativo, com uma mulher mijando num careca com cara de mordomo de filme de terror e os meus olhos castanhos fascinados com aquilo tudo.
O que isso tudo tem a ver? Que nos conta a sua história, Dimi?
Sim e não. O fascínio que o teatro me proporcionou, o vigor que adentrou no meu coração e no meu entusiasmo foi um grande rinoceronte parceiro para aflorar a arte teatral em mim. Fui pra cima, daí conheci os livros – a dramaturgia escrita – as peças, Shakespeare, Stanislavski, Brecht. Assisti outros espetáculos. Comecei a analisar as novelas, atores me atraiam mais. Comecei a ver beleza na arte dos atores, nas nuances criadas, nos jogos. Alguns anos mais tarde fui pra escola técnica e logo a primeira estreia em teatro – “O Clichê do Amor”, de Guilherme Vidal.
E hoje?
teatroMuitas pessoas me perguntam indicações de escolas para a graduação de ator. De pais a adolescentes. E, eu sempre pergunto: Qual é a sua? O que você quer? O que você acha que é ser ator? Sou um questionador até quando sou colaborador. As respostas são sempre muito automáticas, elas vêm em forma de amor à TV, à arte da TV, que também é linda, diga-se de passagem (quando se tem esmero e amor). Todo mundo quer estar na próxima novela da Record – os 10, 11, 12 mandamentos, sei lá o quê. “Assisto todo dia a Malhação, quero entrar lá”, como se fosse uma “firma” que se batesse o ponto e cumprisse o dia. “Um amigo disse que tem uma amiga que conhece uma garota que fez Rebeldes – ah, eu quero. Quero fazer musical, o Rei Leão! Como se fosse simples, trivial! Não quero acabar com o sonho de ninguém, mas sou realista….O mundo de Alice deve ser convertido para o seu, daí se conquista. Caso contrário, a frustração reinará e se não souber lidar com isso, o amor vira rancor.
Um jovem desse pode ter a oportunidade de participar da novela que almejou, mas e a paixão? Onde estará a paixão pela arte de interpretar? Daí leio que determinado ator, que faz um sucesso enorme na televisão aberta, declara que não gosta de teatro. Os seus seguidores, a maioria jovens fãs do seu trabalho, acreditam e reproduzem essa declaração. É um movimento em cadeia….É um efeito dominó. O teatro é a raiz dessa arte televisiva, quer queira ou quer não! Acho preocupante ignorá-lo.
Isso sem contar na enganação generalizada de utilizar um trabalho como fonte de outro. Quantos produtores dá curso de teatro modificando a função de produtor para diretor. Tem gente que compra gato por lebre porque também não se preocupa com as orelhas. Tem que investigar, o olhar tem que ser apurado, porque existe uma fábrica de gente esganiçada para fazer do Teatro uma forma fácil de se levantar dinheiro e aspirantes ao elenco sem entusiasmo. Como já dizia Marcelo em Hamlet – “Há algo de podre no reino da Dinamarca”.
O mais legal de tudo isso é que o caminho com paixão será sempre recheado de pequenas paixões que despertarão o deus interior – o entusiasmo. E teatro com entusiasmo não é demodê. É luxo só!
Foco. Olhos abertos. Foco. Ouvidos atentos. Foco! Gozo!