terça-feira, 29 de outubro de 2019

Recortes da vida - abundada

Pelas lentes embaçadas por um suor dançante, a mulher enxerga o trem ao longe. Logo um surto intermediário entre o cérebro e a respiração a acelera. Ela corre. Nos braços gordos, sacolas verdes de plástico do Armarinhos Fernando. Imensas e cheias de sei lá o quê , coisas que se compra e não se mede o preço e nem o tamanho. E nem a necessidade.

Arfando, esbarra as sacolas numa senhorinha de saias longas que caminha desavisada, a qual chama Jesus; um jovem cabeludo observa e ri silenciosamente. O trem já está maior ao olhar quando ela chega nas escadas. Escolhe a rolante porém, caminha sobre ela esbarrando e bufando para uma mocinha arrumadinha, bonitinha, de rosinha, encalculada numa conversinha bizarrinha no seu celularzinho com capinha da Betty Boop. Sinal para as portas fecharem soa como um sopapo para a mulher. Ela acelera, uma sacola rasga, enxerga-se um monte de pessoas na porta e a poucos passos dá um rompante de 180 graus e uma severa bundada com polegadas Marta Rocha adentra o vagão, sem antes atingir um homem lendo um livro de auto ajuda, em cheio no pinto. "Tomates verdes fritos". O homem resmunga, fecha o livro e curte sua dor.

A porta se fecha e a mulher procura um cúmplice pelo desmanzelo. Ela transpira e molha a testa. Está plena!

Um grito e do lado de fora o cabeludo segura algo. Separando eles, uma porta fechada e o movimento.

"_ Ah, o carrinho do meu neto."
Fiquei comovido, eu acho!

Sem antes perceber que o carrinho era do tamanho da minha perna.

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