teatro
No Teatro grego, o homem era o responsável pelo espetáculo que representava, seja o personagem masculino ou feminino. Tinha, a seu favor, máscaras. Esta invenção cênica foi capaz de supervalorizar a função do ator-homem enquanto personagem feminino. Até que uma certa atriz resolveu romper essa barreira e pisar no palco como mulher. Estava dada a parceria que os homens precisavam. Não há disputa, não é um quiz-show homens x mulheres. É parceria! É história do teatro.
Os personagens masculinos que permeiam as histórias dramatúrgicas são quase infinitos. Instigam nossa imaginação e os vislumbramos com coloridos diferentes. Um Macbeth nas mãos de Lady Macbeth, dois amigos perdidos numa noite suja, na redação de um jornal homens se divertem pelas mãos de Nelson Rodrigues, a macheza exacerbada de Stanley de Tennessee Willians, a deliciosa imaginação de Dom Quixote de la Mancha, o Veludo de Plínio Marcos com sua áspera delicadeza, entre milhões de personagens masculinos já tomaram corpo e forma de atores deste mundão enorme que conhecemos.
brandoEu, enquanto ator, tive experiências impressionantes quando entrei em contato com esses personagens-homens. Quando se pensa que sabemos muito, não sabemos nada ou quase nada. Por isso que estudar sempre (eu disse sempre) vale a pena! No ofício belo e instigador (e não tão fácil assim) de ser ator, estudar é a ferramenta número 1, pois os personagens dentro de você só pedirão passagem quando você deixar eles dialogarem contigo, seja ele homem, mulher, bicho, uma árvore. Lembro-me muito bem que na escola técnica alunos-atores homens diziam (quando eram premiados com personagens masculinos): “Ah é moleza, difícil é fazer mulher!” Mal sabiam que a dificuldade é a mesma. Pensava: “Deus tá vendo!”.
A bem da verdade, a arte do ator/atriz não tem a ver com sermos homem ou mulher. Tem a ver com a disponibilidade da vida que deixamos fluir dentro de nós, deixar os personagens usarem e abusarem do seu corpo em prol de uma boa história. Não é “cavalo”. É teatro. É técnica! É estudo! É humildade e sabedoria.
cateMulheres também podem interpretar personagens masculinos. Não há regras quanto a isso. Direitos iguais. Se os homens divertem e fazem chorar com saias e balangandãs, mulheres podem fazer chorar e rir com homens dramatúrgicos. Lembro-me de ver a atriz Juliana Galdino, em Comunicação à uma academia, de Roberto Alvim, onde interpretava um macaco convertido em humano. Era um primor! O ator Paulo Gustavo usa e abusa dos personagens femininos transformando em riso sua arte. É a arte da transformação interna. O cinema também explora muito essa vertente. Cito Tilda Swinton em “Orlando” e Cate Blanchet em “Não estou lá”, vivendo um Bob Dylan incrível.
Na realidade, leitores, é que não deve haver diferença intelectual com “traços de supremacia” entre homem e mulher no teatro, muito menos fora dele. As diferenças se complementam. O que existem são características físicas do ator ou personagem que favorecem este ou aquele ator/atriz.
Teatro não é ringue. Teatro é uma colcha de retalhos que se constrói para esquentar a alma numa noite fria de verão.
Homens, vamos ao jogo! Mulheres, vamos ao jogo! Que o resultado, com certeza, será delicioso.
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Indicação
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  • Livro para ler: Macbeth, de William Shakespearemacbeth
O Rei Duncan tem altos préstimos pelo general escocês Macbeth. Certo dia, ele e Banquo, outro general, são abordados por três bruxas, que fazem as seguintes previsões: Macbeth será rei; Banquo é menos importante, mas mais pode­roso que Macbeth; e os filhos de Banquo serão reis. Macbeth não compreende as confusas palavras das aparições, mas elas calam fundo dentro de si. Ele relata o estranho encontro para a mulher, Lady Macbeth – uma das mais perfeitas vilãs da lite­ratura –que, ambiciosa, exerce seu poder sobre o marido, levando-o a cometer o gesto fatal de traição ao rei que desencadeará a tragédia dos dois e uma reviravolta na corte.