Por Admir Calazans *
No mês das mulheres, o tema é a mulher. A mulher no teatro.
teatro gregoLá nos tempos do Teatro Grego, a mulher não tinha o direito de ser atriz, era substituída por atores masculinos de plantão. As mulheres de Ésquilo, Aristófanes, Eurípedes e muitas outras ganhavam forças nas máscaras usados pelos atores. Reflexo de uma época. O teatro caminha junto com a época e é capaz de interpretá-lo, recriá-lo e proporcionar ensinamento para nós. Os Homens desdobravam-se entre eles e elas. E as atrizes nem no palco chegavam. O tempo mudou! Ainda bem!
Certa vez, uma corajosa atriz francesa – Therese du Parc (La Champsmele) – ganhou notoriedade por ser a primeira mulher a pisar num palco como atriz. Integrante da trupe de Mólière, se aventurou na trupe de Racine e carrega consigo o título de primeira mulher – atriz – que interpretou Fedra. Ela abriu caminhos.
blancheO fato é que, a mulher, historicamente, foi sempre a segunda a vir. Não me joguem pedras, só estou contextualizando. Se pegarmos Nora – (Casa de Bonecas – Ibsen), Medéia – (Eurípedes), Ofélia e Gertrudes – (Hamlet), Blanche (Tennesse Willians) temos alguns exemplos de como esses personagens tinham que lutar para tornar sua cidadania mais completa e os seus pensamentos mais engatilhados em suas veias. Defendiam com unhas e dentes seus propósitos de amor, traição virtudes, subserviência ou simplesmente ser mulher. Era uma verdadeira epopeia. Personagens, na maioria, são retratos de uma época social. O começo nunca foi fácil, o meio foi mais descobridor, o término é infinito mas recheado de mistérios, erros e acertos.
Graças à essas pérolas – as personagens mulheres – nós temos o privilégio de termos atrizes com percepção aguçada e emoção esvaindo do esterno para o corpo afim de nos tirarem da zona de conforto (que aliás é a maior causa da preguiça exacerbada), e nos fazer pensar sobre o homem. E não precisa estar num teatro gigantesco para isso. Já viajei na história de um personagem de teatro de rua e fiquei de quatro.
O Teatro sempre teve muitos personagens para a mulher/atriz deleitar-se a gosto. Só para citar algumas: Desdêmona (Otelo), Lady Macbeth (Macbeth), Neusa Sueli (Navalha na carne), Fedra (Racine), Blanche DuBois e Stella (Um bonde chamado desejo), Alaíde (Vestido de Noiva), Solteirona (No natal a gente vem te buscar), Joana (Gota d’água), Tereza Carrar (Os fuzis da senhora Carrar), Nina (A Gaivota), dentre tantas outras que não lembrei para escrever aqui. Ah, e os homens-atores também podem aventurar-se a vestir esses personagens. Vale a concepção da encenação. Essa é a democracia teatral!
cacildaEntre “Marílias, Fernandas, Cleydes, Cacildas, Ruths, Glórias, Lauras, Bibis, Terezas, Dinas, Zezés, Nathalias, Dercys, Marias, Tônias, Déborahs, Denises, Dricas”, nós, os espectadores temos que agradecer a Dionísio quando estamos na plateia de mulheres que emocionam, que são capazes de perambular e viver entre o amor e a loucura de Ofélia, as sagacidades de Lady Macbeth, o quase desamor de Blanche DuBois, a simpatia de Pérola, de Mauro Rasi.
Esse nosso país é um tesouro cênico porque a riqueza é tão infinita que não dá para colocar num papel, os milhares de trabalhos femininos que eu já tive a oportunidade de ver e emocionar. A mulher, com sua capacidade de “sobreolhar” é mola propulsora desse fazer teatral. E isso porque nem me ative as diretoras, dramaturgas, técnicas, operacionais. O mês de março não é nada perante os outros meses em que elas se mantêm, lindas, guerreiras, firmes, mães, filhas, íntegras, emocionantes, mulheres. O mês de março é a simbologia de um ano inteiro.
Vivam as mulheres! Vivam e nos ensinem que amar sempre vale a pena!

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Indicação
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  • Livro para ler: Lisístrata – A Guerra do sexo, de Aristófaneslisistrata
A fim de minimizar as agruras da guerra, as mulheres gregas, lideradas por Lisístrata resolvem fazer greve dos deveres do casamento aos seus maridos. Agindo assim, exigem um acordo de paz.
Lisístrata é um retrato de seu tempo e da civilização ocidental. Um retrato bem-humorado, no entanto: inversões de papéis e situações absurdas e carnavalizadas marcam o texto. Nas entrelinhas desta obra-prima do pai da comédia, o que se vê é a discussão de temas tão sérios quanto atuais, como o a paz e a democracia, o amor à pátria e o preço da guerra. Escrita na época em que as mulheres não subiam ao palco.